Esse texto foi o resultado de minha modesta participação da
página de um amigo no facebook, que começou com seu « Bolo da
sexta ». Ele fazia bolos toda sexta-feira, sempre acompanhados dos
deliciosos textos que escreve. Para o aniversário de dois anos de sua
empreitada, resolveu convidar amigos para se prestarem ao mesmo exercício que
ele. Tive a honra de ser a primeira convidada, e de fazer o bolo de aniversário
de dois anos do « Bolo da sexta ». Aqui está ele:
Parabéns pra você, nessa data querida !
Foi assim que começou a minha história com bolos…
Eu nunca fui muito ligada às artes culinárias. Muito pelo
contrário, a cozinha sempre foi, para mim, a representação por excelência da
submissão feminina. Um « piloto de fogão » era tudo o que eu não
poderia ser. Certa ou errada, ainda não sei, queria outra coisa, já que o tal
piloto representava, no meu imagnário, alguém que renuncia à sua própria vida
para alimentar a vida de outros. Em vários sentidos. Então dei as costas para o
mundo encantado da cozinha… Nunca aprendi a cozinhar, nunca fiz bolos, nunca me
interessei por cores e sabores vindos de lá.
Até que minha filha, Julia, veio mudar os meus hábitos
endurecidos. Não que eu tivesse me tornado um gourmet, ainda menos um chef, mas
comecei a ter um certo prazer em poder fazer pequenas coisas que lhe
agradassem, coisas que vinham também da cozinha. Mas bolos ? Bolos não,
isso nunca. Na verdade, nunca fui muito afeita ao gosto mesmo do bolo, à
tradição de um bolo com café… Poderia até comer um pouco, mas fazer… Fazer era
todo um passo ainda muito prematuro para mim.
Julia fez então um ano e questões relativas a uma festa logo
se colocaram, e a questão central, logicamente, para nós, brasileiros, era justamente
saber como seria o tal bolo de aniversário… Como fazer? Eu, em Paris,
querendo festejar o aniversário de um ano de minha filha, tradição
completamente estranha para franceses, e querendo um bolo, daqueles bem
bonitos, bem no centro da mesa. Já imaginava as fotos, aquelas que guardaria
por toda minha vida, de minha filha soprando as velinhas, as primeiras.
Não sabia fazer um bolo, muito menos decorar um, então
encomendei algo que encontrei de mais parecido. Encomendei um
«fraisier», espécie de torta francesa de mousse de baunilha com
morangos frescos. Ele estava bom, mesmo delicioso, mas não era um bolo de
aniversário, ainda menos de criança. Então ficou aquele gostinho de que ainda
faria uma festinha para minha filha como se deve, como fazemos nós, brasileiros.
Quando vivemos num país estrangeiro temos tendência a nos
apegar a certas imagens que temos do que seria uma certa situação para nós, se
estivéssemos « em casa ». Idealizamos essa situação e nos apegamos a
ela como questão de honra. É uma forma de não se esvair totalmente na nova
cultura, de se guardar uma espécie de bastião último do que seríamos verdadeiramente
no âmago mais profundo. No meu caso, isso apareceu, entre outras, na situação
dos aniversários de Julia. Gosto de fazer com ela exatamente o que tinha e que,
de certa forma, todos temos no Brasil. Pensar no aniversário é pensar na festa,
no bolo, no tema, na decoração até a mínima forminha de brigadeiro, nas
lembrancinhas… Nada disso existe na França, e lá não há a mínima cultura de
festas infantis. Eu, ao contrário, vinha de uma família onde festinhas de
aniversário, mesmo as mais simples, eram cuidadas com zelo, com detalhes, e com
muito sabor. Minha mãe sempre fez, e ainda faz, bolos maravilhosos, e minha tia
– minha segunda mãe – era uma doceira ímpar que decorava bolos maravilhosamente
bem.
Minha identidade passava então pela festa de aniversário, e
a festa de aniversário passava pelo bolo… Tinha decidido que não faria mais um
aniversário brasileiro com tortas francesas, precisava de um bolo, um bolo
nosso, grande e decorado. Procurei durante muito tempo uma boleira brasileira
em Paris, até que encontrei e no segundo ano o bolo foi um bolo brasileiro, ao
menos na aparência. Sim, porque ele não era bom… E então fui pensando,
amadurecendo a idéia de enfrentar o mundo misterioso da cozinha fazendo um bolo
para o aniversário seguinte. Eu queria um bolo bom e bonito, e tinha um ano
para aprender…
Passando umas férias de verão no
Brasil em agosto, tomei a decisão e pedi à minha mãe, que sabe fazer bolos como
ninguém, que me ensinasse (para sua imensa surpresa, ficou mesmo
boquiaberta !). Incluímos Sônia no projeto, a diarista que trabalha com
minha mãe e que faz bolos decorados para completar o mês. Ela trouxe materiais,
glacê real e uma folha de papel de arroz para decorar. Era uma decorção simples
dirigida a uma iniciante. Chegando em Paris, tentei repetir os ensinamentos e
tudo saiu perfeito (para minha imensa surpresa, fiquei mesmo
boquiaberta !). Não somente o bolo estava ótimo, mas ele também estva
lindo e deixou em mim o desejo de continuar aprendendo. Estava certo, a partir
de então, que os bolos de aniversário seriam todos feitos por mim.
Ninguém acreditava ! Eu, justo
eu, fazendo bolos tão bonitos, tendo tanta paciência para decorá-los ?
Como assim ? Sim, eu, e tinha gostado…
A partir daí todos os bolos da
casa, assim como todos os bolos das casas amigas foram feitos por mim, e os
bolos viraram uma espécie de desafio. A cada aniversário, cada festa, uma nova
técnica, uma nova receita. Mas sobretudo novas técnicas de decoração. Do glacê
real, passei para a pasta americana, da pasta americana para o buttercream e o
buttercream com merengue suísso. E mais as técnicas evoluíam, mais era
necessário ter certos conhecimentos que, eu, tendo rejeitado tanto pilotar um
fogão, não sabia. Fui pegando então o caminho da cozinha, voltando atrás, mas
não exatamente, porque ela agora era um lugar de festa.
Hoje é o aniversário do Bolo da
Sexta. Dois anos… Dedico então, daqui de Salvador com a ajuda preciosa de minha
mãe e de Sônia, com todo carinho, um bolo de aniversário no estilo dos meus
primeiros… Os bolos que me reconciliaram com uma parte de mim mesma… Sei que,
de certa forma, a reconciliação é também o espírito das suas sextas perfumadas
de bolo.
Parabéns pra você, nessa data
querida ! <3
Tereza
Para quem quiser, a receita do bolo veio daqui:
http://www.nlrockrecipes.com/2012/06/ultimate-lemon-cake.html
Para quem quiser, a receita do bolo veio daqui:
http://www.nlrockrecipes.com/2012/06/ultimate-lemon-cake.html
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